Milhões de famílias brasileiras buscam na contratação de planos de saúde a segurança e previsibilidade em serviços. No entanto, essa expectativa muitas vezes é frustrada por reajustes de mensalidade desproporcionais e sem transparência, além de cancelamentos arbitrários.
Uma estratégia que as operadoras de plano de saúde têm adotado para manter essas práticas abusivas, e de certa forma burlar o controle da Agência Nacional de Saúde (ANS), é oferecer os chamados contratos coletivos.
Essa modalidade prospera devido a uma lacuna regulatória: enquanto planos individuais têm reajustes controlados pela ANS, os coletivos, em geral, não estão sujeitos à mesma supervisão direta. Essa ausência de um teto incentiva operadoras a promoverem os “falsos coletivos” para maximizar lucros sem fiscalização.
O “falso coletivo” é um contrato que, embora classificado formalmente como “coletivo por adesão” (via associação, sindicato ou PJ como microempresa), funciona na prática como um plano individual. A atratividade inicial de mensalidades mais baixas ou redes credenciadas mais amplas esconde o risco de reajustes futuros desproporcionais.
Reajustes no valor dos planos de saúde acima da inflação ou além da faixa liberada pela ANS por “sinistralidade” (relação entre custos da operadora e mensalidades) são legítimos em planos coletivos genuínos.
Contudo, no “falso coletivo”, os reajustes tornam-se abusivos se não houver uma total transparência quanto à composição do reajuste aplicado. Raramente são apresentadas explicações detalhadas, cálculos ou dados objetivos para os percentuais aplicados. Isso configura um aumento unilateral, inauditável e desproporcional, uma vez que os índices superam em muito a inflação e os limites permitidos para planos individuais, sem qualquer conexão com o histórico de uso do beneficiário ou do pequeno grupo.
O Poder Judiciário tem sido claro ao reconhecer que os planos “falso coletivo” devem ser interpretados como planos individuais para a devida proteção do consumidor. Nesse contexto, há um conjunto robusto de decisões judiciais que favorecem o consumidor. Nelas, o Poder Judiciário atua ativamente para preencher o vácuo regulatório, reclassificando os “falsos coletivos” com base na vulnerabilidade do consumidor individual.
Na prática, além de suspender reajustes futuros, a ação judicial permite a recuperação de valores pagos indevidamente nos últimos anos. A conduta abusiva da operadora, a falta de transparência e a imposição unilateral de reajustes podem, inclusive, configurar dano moral.
Em suma, a jurisprudência consolidada, a reclassificação desses contratos, a aplicação das regras da ANS e as proteções do CDC são poderosas salvaguardas para quem se sente que os valores de reajuste do plano de saúde estão muito além do razoável ou do justo. Ao contestar os reajustes abusivos dos planos de saúde, o consumidor não apenas protege seus interesses, mas também contribui para um mercado de saúde suplementar mais justo e transparente.
São Paulo, 05 de agosto de 2025.
Andressa Ribeiro Ferreira