A regulamentação do lobby no Brasil

Renata Freire de Andrade Fonseca de Sousa

Quando se fala em lobby no Brasil é comum que haja um sentimento de reprovação devido à conotação negativa que a palavra adquiriu. Essa má reputação é consequência de uma associação indevida por parte da sociedade e de setores da mídia, que frequentemente associam o lobby com determinados comportamentos delitivos, como a corrupção, o tráfico de influência e a advocacia administrativa.

Segundo o especialista Said Farhat (I): “Lobby é toda atividade organizada, exercida dentro da lei e da ética, por um grupo de interesses definidos e legítimos, com o objetivo de ser ouvido pelo poder público para informá-lo e dele obter determinadas medidas, decisões, atitudes”.

A partir do momento em que o Estado passou a exercer um papel mais ativo na economia do país e a interferir em determinadas áreas, dada a complexidade das matérias relativas ao domínio econômico, exigiu-se maior necessidade de obter informações técnicas e opiniões de grupos de interesses para subsidiarem as suas decisões. Dito isso, o processo de diálogo entre os grupos de interesses e a Administração Pública passou a desempenhar um papel fundamental nos processos decisórios, trazendo mudanças na elaboração das políticas públicas do país e mais qualidade a esses debates. 

A regulamentação do Lobby é uma discussão que se arrasta há cerca de quatro décadas no Congresso Nacional e que ganhou maior repercussão após escândalos de corrupção envolvendo os nossos governantes. A atividade do lobista já é regulamentada em mais de 25 (vinte e cinco) países, e, desde 1990 tem havido propostas para a sua regulamentação no Brasil.

Atualmente, há um projeto de lei na Câmara dos Deputados pronto para ser votado. Proposto em 2007 pelo deputado Carlos Zarattini, o texto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça com um substitutivo à sua versão inicial relatado pela ex-deputada federal Cristiane Brasil. Em 2017 o projeto de lei passou a tramitar em regime de urgência, provocando discussões sobre o assunto.

De acordo com o texto do projeto de lei, poderá exercer a atividade de lobista qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, inclusive entidades representativas de interesses coletivos ou de setores econômicos e sociais. No entanto, o exercício estará vedado àquele que tenha exercido cargo público, de provimento efetivo ou comissionado, ou função pública, no prazo de 12 meses a contar de sua dispensa.

Dentre os critérios propostos, destaca-se o credenciamento facultativo dos lobistas perante os órgãos dos Poderes Legislativo e Executivo, ponto que gerou inúmeras discussões e dividiu opiniões. Ao contrário do que acontece em muitos países que tornaram o credenciamento desses profissionais obrigatório, aqui eles poderão optar pelo registro, havendo tão somente medidas de incentivo para tanto. Esse credenciamento deverá ser negado em algumas hipóteses, dentre elas aos profissionais de relações governamentais que tenham sido condenados por atos de corrupção, tráfico de influência, concussão, advocacia administrativa ou improbidade administrativa, enquanto durarem os efeitos da condenação. 

Outro ponto importante do projeto de lei é a previsão de punição aos profissionais que induzam a prática do ato de improbidade ou para ele concorra ou dele se beneficie, de qualquer forma direta ou indireta.

Vale mencionar que o profissional até então conhecido como “lobista”, será considerado profissional de “Relações Institucionais e Governamentais” (RIG).

Atualmente também há uma iniciativa do Governo Federal, proposta pelo Ministro da Controladoria da União, Wagner Rosário, em sugerir alterações no projeto de lei através de um decreto, sendo essa a medida mais recente no país. No intuito de aumentar ainda mais a transparência na atuação dos lobistas, o Governo deseja criar uma plataforma na qual deverão constar informações sobre a agenda de representantes do governo, de modo que toda população poderá ter acesso a dados detalhados de suas audiências, encontros e viagens.

Conforme pode ser visto, o atual projeto de lei traz um texto pouco rigoroso, aquém do que é visto como tendência no mundo todo, que é a criação de indicativos claros para a atuação desses profissionais. Para uns, a redução de critérios para regulamentar a atividade tende a tornar o projeto de lei ineficaz. Para outros, um texto com um número menor de obrigações será mais adequado ao cenário brasileiro, e, consequentemente, terá maiores chances de avanço.

Com esse desiderato, a aprovação do texto legal representaria um significativo avanço na regulamentação do lobby, não apenas para os profissionais da área, como também para toda a sociedade.

Quanto às empresas, um de canal de comunicação com o Estado realizado através desses profissionais contribuiria para que estes se tornem interlocutores junto ao Congresso Nacional, levando informações técnicas e científicas aos tomadores de decisões. Afinal, quando grupos de interesses oferecem estudos, dados e sugestões aos parlamentares, aumentam-se as chances de verem seus projetos transformarem-se em leis, diminuindo os riscos na tomada de decisões e trazendo benefícios para todo um setor produtivo. Além disso, empresas menores que, normalmente, não encontram espaço para apresentar seus requerimentos e sugestões, ganhariam voz para também participar do processo legislativo.

Dito isso, aprovado o texto do projeto de lei, as empresas também deverão se adequar às mudanças, capacitando os seus profissionais de Relações Governamentais, bem como aperfeiçoando os seus programas de compliance, de forma a impor regras e limites à atuação destes profissionais, segundo critérios pré-estabelecidos.

Por todo o exposto, conclui-se que a regulamentação do lobby viabiliza a transparência e a democratização na participação da sociedade civil perante às decisões do Poder Público, funcionando como importante instrumento do Estado Democrático de Direito.

(I) FARHAT, Said. Lobby, o que é e como se faz. São Paulo, Aberje Editorial. 2007 .


São Paulo, outubro de 2019.


Renata Freire de Andrade Fonseca de Sousa é advogada de Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.


(I) FARHAT, Said. Lobby, o que é e como se faz. São Paulo, Aberje Editorial. 2007.


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