A responsabilidade de sócios por dívidas trabalhistas na S.A. de capital fechado

A responsabilidade dos sócios por dívidas de uma sociedade anônima (S.A.) de capital fechado é um tema de grande relevância no direito empresarial e trabalhista. De acordo com a Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76), uma das principais características dessas sociedades é a separação de patrimônio, que distingue os bens dos sócios dos bens da empresa. Isso significa que os acionistas têm responsabilidade limitada ao preço de emissão de suas ações.

Assim, temos que na Sociedade Anônima as quotas da empresa são divididas em ações, que são comercializadas a um determinado preço. Todos os que adquirem essas ações tornam-se acionistas do negócio, mas não são responsáveis pelos atos administrativos da empresa e as obrigações financeiras não recaem sobre eles. De acordo com a Lei das Sociedades Anônimas[1], em seu artigo 158[2], o administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações contraídas em nome da sociedade em virtude de ato regular de gestão. No entanto, ele responde civilmente pelos prejuízos causados quando agir com culpa ou dolo, ou em violação da lei ou do estatuto.

Em recente decisão, proferida à unanimidade pelo TST[3], o Hospital Santa Catarina S.A., sociedade anônima de capital fechado de Uberlândia (MG), foi condenado em ação trabalhista movida por uma técnica de enfermagem. Como os valores devidos não foram quitados pela empresa, o juízo de primeiro grau acatou incidente de desconsideração da personalidade jurídica e direcionou a execução para os sócios, sendo esta determinação mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG). Contudo, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que os sócios do Hospital não poderiam ser responsabilizados pelas dívidas da empresa sem prova concreta de culpa ou dolo, com base justamente na Lei das Sociedades Anônimas.

Em que pese a Turma do TST entender plenamente aplicável ao Processo do Trabalho a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, por conferir efetividade à execução e possibilitar a satisfação do crédito trabalhista, eminentemente alimentar, concretizando os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho, considerou também que, no caso específico das sociedades anônimas, há legislação específica aplicável, Lei nº 6.404/76, a qual prevê, em seu art. 158, que a responsabilização do administrador depende de demonstração de culpa ou dolo, o que não poderia ser desprezado.

Logo, por não ter sido comprovada no processo a conduta culposa ou dolosa dos seus dirigentes, o colegiado afastou a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, excluindo a responsabilização direta dos sócios pelos valores devidos na ação trabalhista.

Essa decisão reforça a proteção oferecida pela separação de patrimônio nas sociedades anônimas, garantindo que os bens pessoais dos sócios não sejam alcançados para cobrir dívidas trabalhistas da empresa, exceto em casos em que haja comprovação de má-fé ou gestão fraudulenta.

Assim, a desconsideração da personalidade jurídica, que de maneira geral é aplicada na Justiça do Trabalho diante do simples inadimplemento ou em decorrência da inexistência de bens em nome da empresa, permitindo responsabilizar-se diretamente os sócios, só é aplicada, no caso das sociedades anônimas, em situações excepcionais em que se comprova a intenção de fraudar credores ou desviar recursos.

Portanto, para o TST, a responsabilidade dos sócios em uma S.A. de capital fechado é limitada e não solidária, o que representa uma vantagem significativa em relação a outros tipos de sociedades, como as sociedades limitadas, em que a responsabilidade pode ser mais abrangente.

 

[1] Lei 6.404/1976

[2] Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder:

        I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo;

        II - com violação da lei ou do estatuto.

[3] Processo: RR-10248-75.2018.5.03.0134


São Paulo, 15 de outubro de 2024.

Fábio Lima Almeida

Advogado em Trigueiro Fontes Advogados

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