Síndrome de Burnout e o papel do empregador
Alane Martins Menezes

O trabalho ocupa um papel de grande destaque na vida da maioria das pessoas, preenchendo cerca de um terço do dia dos trabalhadores, que diariamente dedicam parcela significativa de tempo e energia às suas ocupações, seja por paixão, aspiração ou mera necessidade.

Segundo o Ministério da Saúde, em nossa sociedade, o trabalho é mediador de integração social por seu valor econômico (subsistência) e pelo aspecto cultural (simbólico), tendo, assim, importância fundamental na construção da subjetividade, no modo de vida e, portanto, na saúde física e mental dos indivíduos. A contribuição do trabalho para as alterações da saúde mental dá-se a partir de ampla gama de aspectos, desde: (i) fatores pontuais, como a exposição a determinado agente tóxico, até (ii) a complexa articulação de fatores relativos à organização do trabalho, como a divisão e parcelamento das tarefas, as políticas de gerenciamento das pessoas e a estrutura hierárquica organizacional. Os transtornos mentais e do comportamento relacionados ao trabalho não resultam de fatores isolados, mas de contextos de trabalho em interação com o corpo e aparato psíquico dos trabalhadores.

As doenças mais comuns nesses casos são a ansiedade e a depressão, porém, algumas variações mais específicas também podem ser observadas, como a síndrome do pânico, e também o Burnout, que é uma doença classificada pelo seu acometimento exclusivamente no ambiente laboral, sendo que indivíduos que já sofrem de outros transtornos psíquicos podem ter mais propensão a desenvolver o Burnout, ou terem seu quadro piorado em virtude de situações no trabalho.

Em 2019 a Síndrome de Burnout foi incluída na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). Na prática, o empregado com este diagnóstico tem garantidos os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários gerados pelo diagnóstico de outras doenças e acidentes decorrentes do trabalho.

Para a Doutora Ana Beatriz Barbosa Silva1, o Burnout é como uma exaustão, que vem na forma de depressão, pânico e fobia relacionada à estrutura de trabalho. O fator desencadeante é exclusivamente o trabalho, causando estafa emocional, despersonalização e autodepreciação.2 3

Exatamente por esta conexão com o trabalho, a juíza Mirella Cahú, da 4ª Vara do Trabalho de João Pessoa e uma das coordenadoras do Programa Trabalho Seguro no estado da Paraíba, explica que a classificação da síndrome como doença ocupacional também possibilita a busca por outras reparações em favor do trabalhador, a exemplo da indenização por dano moral e material em face do empregador.4

Entre os aspectos relacionados à organização do trabalho, destacam-se a pressão pelo desempenho e por produtividade, tarefas fragmentadas, competitividade entre os pares, ritmo de trabalho acelerado, falta de controle sobre a execução da tarefa, longas jornadas de trabalho com poucas pausas, turnos alternados, ritmo intenso, modos de gerenciamento rígidos, desrespeitosos, pouco flexíveis e/ ou excessivamente normatizados, que não consideram as diferenças e vulnerabilidades dos profissionais. Essas características da organização do trabalho têm sido apontadas como determinantes de sofrimento psíquico e adoecimento mental. 

Além disso, outros fatores como, acometimento por doenças físicas do trabalho, exposição a agentes químicos perigosos, acidentes sofridos ou presenciados no trabalho, assaltos e etc., também podem contribuir para a aparição da Síndrome de Burnout, diante da vivência de um trauma direto.

Em recente julgamento da 2ª turma do Tribunal Superior do Trabalho, publicado em 02.06.2023, fica claro o entendimento da corte de que o nexo concausal, ou seja, contribuir para a produção ou o agravamento do resultado, já é o suficiente para que haja a responsabilização da empresa, pois “o empregador tem o controle sobre a estrutura empresarial, e o trabalho desenvolvido”, sendo-lhe aplicável a culpa.5

Diante da complexidade e relevância do tema abordado, torna-se evidente a necessidade de reflexão e ação no âmbito das relações de trabalho. Assim, é imprescindível que as empresas adotem medidas preventivas e fomentem ambientes de trabalho saudáveis, adotando boas práticas de gestão. A conscientização sobre os impactos da Síndrome de Burnout não apenas fortalece a saúde mental dos colaboradores, mas também contribui para a construção de organizações mais humanas e sustentáveis.

 

São Paulo, 01 de Abril de 2024.

Alane Martins Menezes

 

1 Ana Beatriz Barbosa Silva é uma grande médica psiquiatra, palestrante e escritora brasileira. Estudou e se formou na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Escritora de sucessos como “mentes perigosas: o psicopata mora ao lado”, “mentes ansiosas”, entre outros. É uma das maiores referências em saúde mental no Brasil.

2 SILVA, Ana Beatriz Barbosa. MENTES ANSIOSAS. [S. l.: s. n.], 2011.

3 MENTES EM PAUTA - BURNOUT | ANA BEATRIZ - https://www.youtube.com/watch?v=g9cqTDuaMnQ

4 CAHÚ, Juíza Mirella. Janeiro Branco: síndrome de Burnout é classificada como doença ocupacional pela OMS. Saúde Mental no Trabalho, [S. l.], p. 1-1, 26 jan. 2022.

5 (TRT 2ª R.; RR - 1000206-29.2017.5.02.0031; 2ª turma; Rel. Min. Maria Helena Mallmann: DJESP 02.06.2023)


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