A Black Friday e sua relação com a LGPD em tempos de Covid-19
Giullia Matias Pereira do Nascimento

Originada nos Estados Unidos e com crescente movimento aqui no Brasil, a Black Friday é o grande evento comercial para realização de ofertas na última sexta-feira do mês de novembro. A data, ligada à tradição norte-americana, acontece após o dia de Ação de Graças, dando início à temporada de compras de final de ano.

A grande novidade do evento no Brasil este ano não será nenhuma oferta dos comerciantes, mas a entrada em vigor, no dia 18.09.2020, da Lei nº 13.709/18. Também chamada de Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), esta afeta diretamente as formas de fazer negócios pelas empresas. A LGPD tem por objeto regulamentar as operações de tratamento de dados pessoais por parte de empresas públicas e privadas em suas atividades comerciais, a fim de garantir a privacidade e segurança das pessoas físicas. Tal legislação possui um escopo de aplicação muito amplo, porque se aplica a quaisquer informações que possam levar à identificação de uma pessoa física, que é o titular dessas informações. Para fins de aplicação da LGPD, não importa se estes dados estejam registrados em meio físico ou digital, os direitos dos titulares devem ser resguardados.

Desde março de 2020, quando houve a declaração pela Organização Mundial de Saúde da pandemia da doença coronavírus disease (Covid-19), a humanidade teve que se adaptar a um novo modo de vida. Considerando a situação inédita que o mundo tem enfrentado, instituindo, inclusive, medidas de distanciamento e isolamento social para a contenção da proliferação e contágio pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), é certo que o principal meio de negociação e vendas neste ano tem sido pela Internet.

Diversas fontes apontam que houve um aumento exponencial do comércio online, a exemplo do estudo realizado pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC)[1], mas o acréscimo das vendas nesse período também beneficiou as vendas presenciais em alguns segmentos. Esse cenário aumentou a exposição de risco das empresas à LGPD, pois esta lei não se aplica apenas às vendas online. Isso significa que há necessidade de uma prevenção ainda maior, considerando que os titulares dos dados neste caso são, também, consumidores. Em razão disso, especialmente na época da Black Friday, é preciso atenção para o respeito aos deveres de transparência e proteção do consumidor, incluindo nessa esfera de proteção sua privacidade e seus dados pessoais.

Desta forma, há a necessidade de as empresas que exercem atividades comerciais estarem preparadas e adequadas à nova legislação para evitar incorrer em qualquer prática infracional na realização de seus negócios. Embora as penalidades administrativas previstas na LGPD somente possam ser aplicadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) em 1º de agosto de 2021, outros órgãos de fiscalização já estão exercendo controle sobre o compliance da lei, inclusive os órgãos de defesa do consumidor (PROCONS), Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e Poder Judiciário. Exemplo disso é a recente decisão que proibiu a empresa dedicada à proteção ao crédito Serasa Experian de comercializar dados pessoais[2].

Dentre as obrigações das empresas que coletam, armazenam, compartilham e tratam dados de seus clientes/consumidores, destaca-se a necessidade de deixar claro como todo este procedimento será realizado; qual a finalidade e destinação dos dados; bem como agir com transparência, garantindo informações claras e de fácil acesso aos titulares. Cada empresa deve assegurar que qualquer tratamento de dados esteja lastreado em uma base legal que autorize essa atividade. Em alguns casos, cabe ao titular consentir ou não o uso dos dados pessoais, sendo-lhe inclusive reservado o direito de requerer a exclusão.

Por fim, os direitos que os titulares ou consumidores podem exercer desde a entrada em vigor da LGPD, em setembro de 2020, são amplos e vão desde a solicitação de informações sobre as formas de tratamento até a portabilidade de seus dados. Assim, mesmo com os impactos trazidos pela Covid-19 ao comércio, é também um desafio a se levar em consideração o processo de adequação das empresas às exigências trazidas pela LGPD. A expectativa é de que a Black Friday apresente o início de um alívio ao setor comercial e um novo capítulo nas relações consumidor-fornecedor, com especial atenção à proteção dos dados pessoais.

 


São Paulo, novembro de 2020.

Giullia Matias Pereira do Nascimento é advogada de Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.

 


[1] SBVC – Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo; “Novos Hábitos Digitais em tempos de Covid-19”; http://sbvc.com.br/novos-habitos-digitais-em-tempos-de-covid-19/; novembro/2020.

[2] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/11/justica-manda-serasa-parar-de-vender-dados-pessoais-de-brasileiros.shtml


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