O nó da logística reversa
Ana Carolina F. de Melo Brito

Está em curso o prazo para milhares de empresas que colocaram produtos no Estado do Mato Grosso do Sul no último ano informarem ao Ministério Público Estadual (MP-MS): (i) se aderiram ao cadastro estadual de logística reversa (Sisrev/MS); (i) justificar porque não o fizeram ou (iii) manifestar o interesse em assinar termo para ajustamento de conduta.

Mais especificamente, o edital de intimação, republicado em 27.11.2020, lista as empresas que tem o prazo de 10 dias úteis para apresentar a informação ao MP-MS acerca do atendimento ao Decreto Normativo Estadual nº 15.340/2019, que versa sobre a logística reversa de embalagens em geral.

Neste ponto, vale pontuar que foi assinado um acordo setorial de abrangência nacional para o retorno pós-consumo das embalagens em geral foi assinado em 2015. Com metas estabelecidas até 2017 (Fase 1), esse acordo está estruturado de acordo com a figura representativa abaixo

Fonte: https://www.coalizaoembalagens.com.br/

Importante notar que esse desenho estrutural foi costurado no acordo setorial nacional após estudo de viabilidade técnica e econômica e consulta a diversos setores da sociedade, tal como determina a Lei nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos- PNRS). A propósito, o entendimento de que os atos do Poder Público tem impacto e precisam ser medidos antes de editados também foi positivado no art. 5º da chamada Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019). O regulamento do Estatuto da Liberdade exige que, a partir de 2021[1], a Administração Pública Federal análise previamente se os impactos econômicos decorrentes das medidas são razoáveis ao ponto de justificar a edição da nova regulação[2].  Seria muito salutar que essa concepção fosse abraçada de forma integral pelo Direito Ambiental e seus operadores, como se verá adiante.

Voltando ao caso do Estado pantaneiro, a lógica do edital em comento é que caberá às empresas demonstrar que não precisam se cadastrar no sistema estadual ou justificar porque ainda não fizeram, seja porque já são integrantes de outro sistema de logística reversa mais abrangente, seja porque integram outra cadeia de produção cuja logística de retorno já incluem as embalagens de seus produtos, seja por outras razões fáticas ou legais. Observa-se que a intimação do MP-MS não se limita às empresas submetidas ao acordo setorial nacional de embalagens em geral para averiguar como está o tema no Estado, ou seja, como estão cumprindo as normas. Todas as empresas que ingressaram produtos no Estado, conforme informações fornecidas pela Secretaria da Fazenda, terão que prestar informações. São milhares de empresas e respostas que precisarão ser analisadas pelo MP-MS, o que suscita indagações sobre a eficiência de tal abordagem.

Por fim, lembramos que, ao fixar normas gerais sobre resíduos sólidos, a PNRS e seus regulamentos estabelecem que o sistema de logística reversa de maior abrangência geográfica prevalecerá sobre as regulações de menor cobertura territorial.  As normas locais devem preservar a compatibilidade com as normas previstas em acordo setorial ou termo de compromisso firmado com a União. Não obstante, há inúmeras e crescentes iniciativas pelo Brasil para, cada qual à sua maneira, resolver o importante e complexo problema dos resíduos sólidos.

Esses pontos ora trazidos ao debate são apenas alguns dos que este caso desperta. O nó da logística reversa de resíduos pós consumo é velho conhecido dos operadores do Direito Ambiental. Essa questão perpassa pelos conflitos de competência entre os entes da federação (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), que ainda não foram solucionados e bem compreendidos, a despeito de quase 10 anos desde a edição da Lei Complementar 140/2011.

 

São Paulo, dezembro de 2020.

Ana Carolina F. de Melo Brito é sócia de Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.

 

[1] Decreto nº 10.411 de 30 de junho de 2020. Art. 24. 

[2] Decreto nº 10.411 de 30 de junho de 2020. Art. 4º, § 1º .


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