Com a eclosão da pandemia de COVID-19 no Brasil foram iniciados diversos protocolos para achatamento da curva de contaminação, incluindo distanciamento e isolamento social.
Diante disso, algumas empresas iniciaram o processo de adequação para que seus empregados se ausentassem dos postos presenciais e iniciassem, de forma segura, o desenvolvimento de suas atividades remotamente.
No entanto, a possibilidade de execução das atividades enquadradas como essenciais previstas no artigo 10º da Lei nº 7.783/89, foram mantidas a fim de garantir o atendimento de necessidades básicas da sociedade.
Diante deste cenário, discute-se se, em face da possibilidade de maior exposição ao contágio, se a empresa deverá realizar o pagamento do adicional de insalubridade aos empregados que, neste momento, não podem suspender suas atividades, assim como, se necessário, qual seria o percentual a ser pago e durante quanto tempo haveria de ser realizado o pagamento.
Sobre o tema, inicialmente, é preciso verificar que os artigos 189 e 190 ambos da Consolidação das Leis do Trabalho, conceituam as atividades que são consideradas insalubres 1. De acordo com o referido texto, são insalubres as atividades que expõe os empregados ao contato com agentes nocivos, acima dos limites de tolerância e levando em consideração, também, a intensidade e tempo de exposição, critérios estes que serão avaliados nos termos da legislação vigente.
Além disso, há, também, a Norma Regulamentadora 15 que, em seus termos, tutela os limites de tolerância dos agentes insalubres para cada atividade que é enquadrada como nociva à saúde, assegurando o pagamento de adicional no percentual de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo para atividades enquadradas como insalubres. 2
Note-se, ainda, que é incontroverso que os profissionais da área de saúde, os quais mantém contato direto com os infectados ou possíveis casos, já recebem ou, ao menos, deveriam receber o adicional de insalubridade em grau máximo, equivalente a 40% do salário mínimo. 3
Sendo assim, a dúvida diz respeito aos profissionais que prestam seus serviços em atividades essenciais, até então reputadas como plenamente hígidas e que, independentemente dos riscos de contaminação pelo COVID-19 e do reconhecido estado de calamidade pública, devem continuar prestando seus serviços in loco.
Nesse sentido, é de se notar que a Medida Provisória 927/2020 4 tutelou diversas regras emergenciais para gestão das relações de trabalho durante a pandemia de COVID-19, assim como, a Medida Provisória 936/2020 5 dispôs medidas complementares para enfrentar do estado de calamidade pública, entretanto, não há menção sobre a necessidade de pagamento do adicional de insalubridade aos empregados que estão prestando seus serviços, de modo presencial, em prol das atividades reputadas como essenciais.
No momento há somente projetos de lei (Lei nº 830/20 e Lei nº 1828/20), ainda não aprovados, que garantem aos profissionais de serviços essenciais o recebimento do adicional de insalubridade, em grau máximo (40% do salário mínimo), sendo devido o pagamento enquanto perdurar o estado de calamidade pública, em razão da exposição direta ou indireta ao vírus.
Dito isso, considerando o cenário como um todo e a inexistência de previsão específica para pagamento do adicional de insalubridade aos empregados que estão laborando em atividades essenciais durante a pandemia de COVID-19, cabe à empresa, com a ajuda de seus departamentos de saúde ocupacional, recursos humanos e jurídicos, avaliar, cuidadosamente, os seus riscos e, após, decidir pela estratégia mais adequada para gestão dos seus empregados durante a pandemia de COVID-19.
São Paulo, abril de 2020.
Raíssa Gabriela Afonso Pereira é advogada de Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.
1 Art.189 - Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
Art.190 - O Ministério do Trabalho aprovará o quadro das atividades e operações insalubres e adotará normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
2 https://enit.trabalho.gov.br/portal/images/Arquivos_SST/SST_NR/NR-15-atualizada-2019.pdf
3 AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 932, IV, DO CPC. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO. MÉDICO. CONTATO COM PACIENTES POTENCIALMENTE PORTADORES DE DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS. De acordo com o Anexo 14 da NR-15 da Portaria MTE 3.214/78, é devido o adicional de insalubridade em grau máximo nos trabalhos ou operações em contato permanente com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como objetos de seu uso não previamente esterilizados. Apelo da ré não provido, no aspecto. (TRT 4ª R.; ROT 0020526-07.2018.5.04.0103; Segunda Turma; Rel. Des. Marcelo José Ferlin D´Ambroso; Julg. 17/03/2020; DEJTRS 26/03/2020)
RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO. É devido adicional de insalubridade em grau máximo aos enfermeiros que laboram em Unidade de Pronto Atendimento pela exposição a agentes insalubres em grau máximo. Apelo provido. Assistência Judiciária Gratuita. Cabível o deferimento dos benefícios da justiça gratuita ao sindicato que atua na condição de substituto processual, em harmonia com a pacifica jurisprudência do TST sobre o tema. Recurso provido. (TRT 4ª R.; RO 0021795-64.2017.5.04.0411; Primeira Turma; Relª Desª Rosane Serafini Casa Nova; DEJTRS 25/06/2019; Pág. 510)
4 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm
5 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv936.htm